sábado, 4 de novembro de 2017

A verdadeira história de Layka



Laika, a vira-lata 'pioneira' enviada ao espaço há 60 anos em missão 'sem volta'


Cadela Lika dentro de capsula que seria enviada ao espaço.Direito de imagemAFP/GETTY IMAGES
Image captionLika foi enviada ao espaço quando não havia ainda tecnologia para voltar à Terra. A morte dela era certa...

Há exatos 60 anos, um ser vivo deixou, pela primeira vez, o planeta Terra rumo ao espaço: a cachorrinha Laika, lançada no satélite russo Sputnik 2, em 3 de novembro de 1957. 
A pioneira de quatro patas não retornou. Tornou-se a primeira "vítima" das aventuras espaciais, encabeçando uma lista que aumentaria ao longo do tempo com outros bichos e seres humanos. 
Entre 1948 e 1961, 48 cães, 15 macacos e dois coelhos abriram caminho para descobertas no espaço, sendo que 27 deles morreram em acidentes e devido a circunstâncias imprevistas durante a empreitada. Laika foi o único animal deliberadamente enviado para uma morte certa longe da Terra. 

Corrida espacial

No auge da Guerra Fria, o líder soviético Nikita Khrushchev, que assumiu o comando da União Soviética dois anos após a morte de Josef Stálin, se engajou em uma corrida espacial contra os Estados Unidos - uma disputa de poder amplamente exposta em propagandas nos dois países. 
Os dois impérios tentavam ampliar suas esferas de influência no mundo. "Conquistar o espaço" seria uma demonstração de força, tecnologia e desenvolvimento. 
Se, por um lado, Khrushchev alocou enormes somas de recursos para a pesquisa espacial, a pressa impedia um trabalho sistemático e detalhado. O primeiro satélite russo desocupado entrou em órbita no dia 4 de outubro de 1957. 
Entusiasmado, o líder da União Soviética exigiu do engenheiro responsável programa espacial, Sergey Korolev, algo "espetacular" para o 40º aniversário da revolução comunista. 

LikaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionGrupos de defesa dos direitos dos animais protestaram após saberem que Laika havia morrido

Korolev propôs, então, enviar um cachorro ao espaço. Como, àquela altura, eles não tinham tecnologia suficiente para garantir o retorno do satélite, o animal estaria sendo enviado para a morte. 
O pesquisador Alexander Nikonov sugere que Khrushchev tenha concordado porque nunca teve um cachorro na vida. Durante muitos anos, o governo soviético divulgou a notícia de que Laika teria morrido, sem dor, após uma semana em órbita. Mas hoje já se sabe que o cão morreu seis horas após o lançamento, da combinação de problemas respiratórios e uma parada cardíaca após o superaquecimento da cabine. 
A primeira evidência das circunstâncias da morte foi apresentada em 2002 no World Space Congress, em Houston, no Texas, por Dimitri Malashenkov, do Instituto para Problemas Biológicos de Moscou. 
Cães espaciais
Alguns critérios eram seguidos para a seleção dos cães que poderiam ser enviados ao espaço. Primeiro, por causa do tamanho do foguete, o animal deveria ter até no máximo 7 kg. 
Cães de raça e com pedigree foram considerados mimados demais e incapazes de alcançar bons resultados nos cursos de "sobrevivência em situações graves". Portanto, o "esquadrão de cães cosmonautas" foi recrutado, principalmente, nas ruas. Laika, por exemplo, zanzava pelas ruas de Moscou quando foi recrutada. 
Os especialistas preferiam trabalhar com fêmeas, por considerá-las mais disciplinadas, e os animais de pelo liso eram considerados mais adequados para a instalação de sensores.

Conteiner de tamanho semelhante à capsula foi usado antes do lançamento, para que Lika se acostumasse a ficar quase imobilizada, num abiente pequeno.Direito de imagemMLADEN ANTONOVMLADEN ANTONOV/AFP/GETTY IMAGES
Image captionContêiner de tamanho semelhante à capsula foi usado antes do lançamento, para que Laika se acostumasse a ficar quase imobilizada, num ambiente pequeno.

Dos 10 candidatos pré-selecionados para o teste final - resistência na câmara de pressão centrífuga -, três se sobressaíram: Albina, Laika e Mukhu. Albina estava grávida, Mukhu foi rejeitada por ter curvas não fotogênicas nas patas. Laika foi escolhida para morrer no espaço e entrar para a história. 

Cápsula do tamanho de uma máquina de lavar

O Sputnik 2 não foi tecnicamente projetado para pousar. Era um cilindro de cerca de 4 metros de altura e 2 metros de diâmetro. 
Laika estava em uma cápsula do tamanho de uma máquina de lavar roupa, com um dispositivo para regeneração química do ar e um alimentador automático que abria, duas vezes por dia, a tampa de um recipiente com uma mistura de nutrientes gelatinosos. 
Cirurgiões implantaram nas costelas de Laika um sensor para medir respiração. Um sensor para medir o pulso foi implantado na artéria carótida. 
Também foram ativados dispositivos para medir temperatura, pressão e realizar cardiogramas. Nos últimos dias antes do lançamento, a cadelinha foi colocada em uma cápsula todos os dias, por várias horas, para que se acostumasse com a situação. 

Laika dentro da cápsula do satéliteDireito de imagemKEYSTONE/GETTY IMAGES
Image captionLaika foi treinada por várias semanas para ir ao espaço, mas morreu poucas horas depois do lançamento por causa de um superaquecimento da cápsula

A morte
Os sensores implantados em Laika mostraram que, durante o lançamento, o ritmo do batimento cardíaco da cadelinha aumentou muito, ficando três vezes acima do batimento em estado de repouso. 
Demorou três vezes mais tempo para o pulso voltar aos níveis pré-lançamento do que tempo registrado em testes centrífugos feitos com ela antes do lançamento - um indicador do alto grau de stress sofrido por Laika no trajeto ao espaço. 
Sensores de temperatura mostraram que a umidade e temperatura da cápsula onde o cachorro estava aumentaram pouco após o início da missão. A temperatura chegou a ultrapassar 40 graus. 
Seis horas depois da decolagem, os sensores registraram a parada cardíaca de Laika. Estava claro que a cadelinha havia morrido em decorrência do superaquecimento da cabine e do stress. 
O satélite com o corpo de Laika fez 2.370 voltas em órbita e pegou fogo ao entrar na atmosfera em 14 de abril de 1958. 

A informação que chegou ao público


Macaco em cápsula antes de ser lançado ao espaçoDireito de imagemNASA
Image captionA Nasa usou macacos em várias viagens espaciais; oito deles morreram

O governo soviético ocultou a informação sobre a morte de Laika. Por uma semana, os jornais locais publicaram boletins informativos sobre a saúde da cadelinha que, na verdade, já estava morta. A informação repassada dava margem para que a população pensasse que ela poderia retornar. 
A mídia mundial se admirava do feito soviético e manifestava preocupação com o viajante de quatro patas. Mas quando a agência de notícias soviética informou que Laika fora sacrificada em órbita "por motivos de humanidade" , os aplausos se transformaram protestos de defensores de animais. 
Centenas de cartas foram enviadas a Moscou e às Nações Unidas denunciando a "crueldade" do programa espacial. Algumas argumentavam que teria sido melhor mandar Khrushchev ao espaço em vez do cachorro. 
Animais continuaram a ir ao espaço
Mas o uso de animais em testes espaciais continuou, com a finalidade de garantir o lançamento seguro de seres humanos. Enquanto a União Soviética usou cães e, depois, coelhos, os Estados Unidos usaram macacos. 
Na União Soviética, de 1948 a 1961, 48 cães foram lançados ao espaço, 20 deles morreram: Desik, Fox, Mishka, Chizhik, Mishka-2, Ryzhik, Lisa-2, Bulba, Rita, Red, Joyna, Palma, Pushok, Julba, Botão, Laika, Gaivota, Chanterelle, Bee e Fly.
Ao mesmo tempo, os americanos enviaram 15 macacos para o espaço, sendo que oito morreram: Albert-1, Albert-2, Albert-3, Albert-4, Albert-5, Gordo, Goliath e Scatback.

cachorro e coelhoDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionCães e coelhos foram usados em testes espaciais, depois de Laika

As primeiras criaturas vivas que voltaram à Terra com segurança, usando paraquedas, foram os cães Desik e Gypsy (União Soviética, 22 de julho de 1951) e o chimpanzé Yorik (EUA, 20 de setembro de 1951). Desik morreu uma semana depois de retornar. Gypsy foi levado para a casa do acadêmico Anatoly Blagonravov. 
Em 1966, quando havia dúvida sobre a possibilidade de permanência prolongada de seres humanos no espaço, a União Soviética enviou o satélite Kosmos-110, com os cães Vaterk e Ugolkom. Ambos retornaram vivos, porém exauridos, após 23 dias em órbita.
O envio de animais ao espaço começou a cessar com o lançamento de seres humanos. Yuri Gagarin, que ficou uma hora e meia no espaço em 1961, em uma missão que exigia pouca destreza, brincou uma vez dizendo que foi, ao mesmo tempo, a "primeira pessoa e o último cachorro no espaço". 

O homem mais rico do mundo.

'O homem mais rico da história', de quem você talvez nunca tenha ouvido falar


Jakob FuggerDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionDe acordo com seu biógrafo, Jakob Fugger tinha uma fortuna superior a US$ 400 bilhões

Se estivesse vivo hoje, Jakob Fugger (1459-1525) seria, calcula-se, mais rico que Bill Gates, Warren Buffet, Carlos Slim e Mark Zuckerberg juntos.
O banqueiro alemão - apelidado de "O rico" - chegou a acumular, ao longo da vida, uma fortuna equivalente ao que hoje seriam US$ 400 bilhões (R$ 1,2 trilhão), segundo o biógrafo Greg Steinmetz.
Ex-editor do Wall Street Journal, Steinmetz considera Fugger o homem mais rico da história, e foi esse o título que deu ao livro que escreveu sobre o banqueiro em 2015.
Embora muitas pessoas levantem ressalvas à comparação da riqueza em diferentes períodos históricos, de uma coisa Steinmetz se diz seguro: "Jakob Fugger foi sem dúvida o mais poderoso banqueiro de todos os tempos", disse ele à BBC Mundo, o serviço da BBC em espanhol.

Jakob FuggerDireito de imagemSIMON & SCHUSTER
Image captionCapa do livro "O homem mais rico que já existiu", em tradução livre

Em que ele baseia essa afirmação?
"No Renascimento, a época em que Fugger viveu, o mundo era controlado por duas figuras: o imperador romano e o papa. E Fugger financiou os dois", diz o biógrafo.
Na avaliação de Steinmetz, nenhum banqueiro em toda a história teve tanta influência sobre o poder político como Fugger.
"Fugger decidiu que o rei da Espanha, Carlos 1º, deveria ser o imperador de Roma e o fez vencer a eleição (com o nome de Carlos 5º)", disse ele. "Carlos 5º colonizou o Novo Mundo. A história não seria a mesma se não tivesse chegado ao poder."

Desconhecido

Como se explica então que poucos tenham ouvido falar de Jakob Fugger? E que, em vez disso, saibamos tanto sobre alguns de seus contemporâneos, como os Médici, os irmãos César e Lucrécia Bórgia ou Nicolau Maquiavel?
Uma das razões, de acordo com Steinmetz, é que Fugger era alemão e não se tornou conhecido no mundo anglófono. E foi exatamente isso que motivou o autor a escrever sobre o banqueiro.

Escudo com brasão de sua famíliaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionFugger foi o primeiro comerciante que conseguiu ser nomeado conde

"Fui chefe da sucursal do Wall Street Journal em Berlim e ouvi uma menção a Fugger, mas não consegui encontrar um único texto em inglês sobre isso", conta.
Mas talvez o principal motivo pelo qual poucos fora de seu país de origem conheçam a história desse homem é porque ele não era um personagem colorido, como os outros famosos citados de sua época.
Ele não tentou se tornar papa nem ocupar cargos políticos. Ele não patrocinou nenhum artista renascentista. Nem construiu palácios ou templos.

Conjunto habitacional criado por FuggerDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionO projeto de habitação social que Fugger criou na cidade de Augsburg continua 500 anos depois e é o lar de aposentados

Sua obra mais famosa é o Fuggerei: um projeto de habitação social que criou na cidade de Augsburg, no sul da Alemanha, e que continua conhecida porque quem vive ali paga um aluguel simbólico de US$ 1 por ano.
"Os banqueiros estão acostumados a trabalhar nos bastidores", disse Steinmetz, sobre a baixa notoriedade do homem sobre quem escreveu.

Legado

Isso não significa que Jakob Fugger não tenha deixado a sua marca. Na verdade, sua influência pode ser sentida até hoje, embora muitos não saibam disso.
A seguir, cinco heranças importantes desse ilustre desconhecido:

Retrato de FuggerDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionUma amostra da importância de Fugger é que ele foi retratado pelos artistas mais renomados de sua época, como Dürer e Hans Holbein, o Velho (autor desta imagem)

1. Criou a primeira multinacional

Em sua época, a atividade econômica era pequena. Os ricos viviam de suas terras e do trabalho dos camponeses, que recebiam proteção em troca.
Fugger negociou direitos a mineiros em troca de seus empréstimos e, assim, conseguiu monopolizar o comércio de cobre e prata.
Além disso, ele comercializou especiarias. Assim, foi um dos precursores do capitalismo.

Greg SteinmetzDireito de imagemGREG STEINMETZ
Image captionSteinmetz se interessou pela vida de Fugger enquanto chefiava a sucursal do 'Wall Street Journal' em Berlim

2. Criou o primeiro serviço de notícias

Fugger sabia que a informação é valiosa e, portanto, queria acessá-la antes de seus concorrentes.
Para isso, ele pagou mensageiros para trazer informações sobre a atividade comercial e política de diferentes cidades.
Seus sucessores mantiveram a tradição e criaram o Fugger Newsletters, que alguns consideram um dos primeiros jornais da história.

3. Criou formas de financiar dinheiro que perduram até hoje

Os Médici, por exemplo, ja tinham bancos naquela época, mas a Igreja Católica não permitia o pagamento de juros, por considerá-lo ganância.

Banheiro de Fugger em AugsburgDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionO banheiro da mansão do Fugger em Augsburg era luxuoso

Fugger convenceu o papa Leão 10 - um cliente seu - a suspender essa proibição e começou a oferecer uma taxa de juros de 5% ao ano para os clientes que depositavam dinheiro no seu banco de Augsburg.

4. Financiou exploradores

Ele tinha 33 anos quando Colombo descobriu a América. Interessado ​​no potencial econômico dessas expedições, financiou a primeira viagem para a Índia.
Ele também foi um dos financiadores da viagem ao redor do mundo de Fernão de Magalhães.

5. Acabou estimulando a Reforma Protestante

Um dos negócios que Fugger manteve com o Vaticano foi a venda de indulgências.

FuggerDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionFugger casou em 1498 com Sybille Arzt, de uma das famílias fundadoras de Augsburg. Eles não tiveram filhos e seus sobrinhos Anton e Raymund herdaram o negócio da família

Ele propôs uma forma de financiar a catedral de São Pedro. A metade dos rendimentos foi destinada a esse fim e a outra metade ficava com ele.
Neste ano completam 500 anos desde que Martinho Lutero protestou contra esse negócio, dando origem à Reforma Protestante.