domingo, 29 de janeiro de 2017

Para todos os pedagogos



Do que é capaz um homem em nome do dinheiro? Vamos pensar.
Seria capaz de inventar, deliberadamente, uma doença para faturar com os dividendos de vendas de medicamentos da indústria farmacêutica? Sim? Então vamos tornar a coisa mais inverossímil, piorando um pouco essa história. Pois que esta doença seja "criada" como um transtorno infantil, já que crianças são vítimas fáceis para nossa trama funestra. Ainda não está bom para você? Então vamos dizer que um pseudomedicamento elaborado especialmente para esta doença fictícia seja um psicotrópico com potencial de dependência química, afinal, nada melhor para garantir os dividendos a longo prazo. Vamos incrementar um pouco mais dizendo que este suposto psicotrópico possa causar, além da dependência esperada, insônia, surtos psicóticos, piora na cognição e atenção (sic! mas, hein?!?), alucinações, morte súbita e até evoluir para tendências homicidas e suicidas! Muito forçado para ser um exercício mental? Bom, vamos agora sair da matrix. Isso tudo é real.
De fato, uma doença, a pouco inexistente, foi criada e catalogada oficialmente, aceita pelos órgãos de saúde do mundo todo. Um medicamento para este mal foi elaborado/destacado. Toda uma legião de vítimas infantis, juvenis e até adultas foi prejudicada. A indústria farmacêutica, recrutando médicos patrocinados e entidades envolvidos financeiramente, faturou horrores e, principalmente, o autor da falsa doença ganhou fama, reconhecimento e muito dinheiro pelo "feito".
Passado o choque, estamos falando o TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade) e seu medicamento atrelado o metilfenidato, popularmente conhecida como ritalina. O famigerado "médico" é o dr. Leon Eisenberg e as vítimas milhares, talvez mais, de crianças, jovens e adultos diagnosticados com a "doença" no mundo todo (curiosamente, na França, a incidência do TDAH é quase zero - será o foie gras ou lá não existem órgãos de saúde responsáveis?).
Antes de qualquer juízo, basta dizer que o próprio Leon Eisenberg, considerado o pai do TDAH, afirmou pouco antes de sua morte: "Trata-se de um excelente exemplo de uma doença fictícia". Ele viveu confortável e luxuosamente (muito graças aos lucros do golpe) até os 87 anos de idade e confessou a imensa farsa apenas sete meses antes de morrer, em sua última entrevista.
Aviso aos navegantes: não é raro o envolvimento financeiro de representantes de comitês, organizações e órgãos médicos com a indústria farmacêutica. Sobre o assunto escreverei em outra oportunidade.
Segundo Maria Aparecida Affonso Moysés, professora titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (dado de agosto de 2013), um levantamento de 2011, publicado pelo órgão governamental de saúde dos Estados Unidos, analisou todas as publicações de 1980 a 2010 sobre o tratamento de TDAH e o resultado foi no mínimo intrigante. Cerca de 10.000 trabalhos atestavam a ritalina como medicamento eficaz e seguro contra o transtorno, mas apenas 12, sim somente 12, se revestiam do rigor de uma publicação científica. E, de qualquer maneira, estes trabalhos científicos atribuíam alta eficiência do tratamento do TDAH unicamente à orientação familiar e baixa eficiência ao uso da ritalina isoladamente.
O mundo moderno acabou criando pais propensos a acreditarem que seus filhos possuem problemas congênitos e não comportamentais. Fácil de entender quando percebemos que a primeira hipótese os liberta de qualquer responsabilidade e culpa e a segunda hipótese os culpa quase que integralmente pelo transtorno. A maioria dos pais acabam aceitando a primeira opção.
Afora todas as atrocidades de cientistas malucos e indústrias sedentas de lucros, cabe a nós uma parcela de culpa quando optamos por aceitar todos os ditames da vida moderna, da concorrência imposta pelo capitalismo, de nosso desejo de ter filhos "bem sucedidos" e bem enquadrados nessa sociedade de réplicas perfeitas que não aceitam indivíduos aquém dos limites aceitáveis impostos por interesses acima de qualquer opção fraternal. Afinal, ainda que uma parcela dos diagnosticados tenha de fato um TDAH, por que temos que utilizar de drogas e outros artifícios para que nossos filhos sejam enquadrados, de uma vez por todas e finalmente, nesta "legião de iguais"? Somos indivíduos diferentes, com qualidades e falhas específicas. Por que é tão difícil aceitar isso? Talvez devamos lutar não mais para alterar as mentes e corpos de filhos ou de qualquer ser humano fora dos padrões aceitáveis por esta sociedade corrompida, mas lutar efetivamente por uma sociedade mais justa e tolerante com todos os diferentes e menos hábeis de enquadramento na nossa tribo cruel, inclusive, mais solidária com as crianças com "comportamento" do TDAH de fato.

fontes:
http://sites.uai.com.br/app/noticia/saudeplena/noticias/2013/08/27/noticia_saudeplena,145124/pediatra-da-unicamp-condena-uso-de-medicamentos-para-tdah.shtml

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Revolução industrial

Revolução Industrial

História da Revolução Industrial, pioneirismo inglês, invenções de máquinas, passagem da manufatura para a maquinofatura, a vida nas fábricas, origem dos sindicatos e principais invenções técnicas.

Interior de uma fábrica durante a Revolução Industrial
Interior de uma fábrica durante a Revolução Industrial

Introdução 


A Revolução Industrial teve início no século XVIII, na Inglaterra, com a mecanização dos sistemas de produção. Enquanto na Idade Média o artesanato era a forma de produzir mais utilizada, na Idade Moderna tudo mudou. A burguesia industrial, ávida por maiores lucros, menores custos e produção acelerada, buscou alternativas para melhorar a produção de mercadorias. Também podemos apontar o crescimento populacional, que trouxe maior demanda de produtos e mercadorias.

Pioneirismo Inglês

Foi a Inglaterra o país que saiu na frente no processo de Revolução Industrial do século XVIII. Este fato pode ser explicado por diversos fatores. A Inglaterra possuía grandes reservas de carvão mineral em seu subsolo, ou seja, a principal fonte de energia para movimentar as máquinas e as locomotivas à vapor.

Além da fonte de energia, os ingleses possuíam grandes reservas de minério de ferro, a principal matéria-prima utilizada neste período. A mão-de-obra disponível em abundância (desde a Lei dos Cercamentos de Terras ), também favoreceu a Inglaterra, pois havia uma massa de trabalhadores procurando emprego nas cidades inglesas do século XVIII. A burguesia inglesa tinha capital suficiente para financiar as fábricas, comprar matéria-prima e máquinas e contratar empregados. O mercado consumidor inglês também pode ser destacado como importante fator que contribuiu para o pioneirismo inglês.

Avanços da Tecnologia 


O século XVIII foi marcado pelo grande salto tecnológico nos transportes e máquinas. As máquinas a vapor, principalmente os gigantes teares, revolucionou o modo de produzir. Se por um lado a máquina substituiu o homem, gerando milhares de desempregados, por outro baixou o preço de mercadorias e acelerou o ritmo de produção.



Locomotiva: importante avanço nos meios de transporte

Na área de transportes, podemos destacar a invenção das locomotivas a vapor (maria fumaça) e os trens a vapor. Com estes meios de transportes, foi possível transportar mais mercadorias e pessoas, num tempo mais curto e com custos mais baixos. 

Principais invenções técnicas da Revolução Industrial: lançadeira volante de John Kay, tear mecânico de Cartwright, máquina a vapor de JamesWatt e locomotiva de Stephenson.
 
A Fábrica
As fábricas do início da Revolução Industrial não apresentavam o melhor dos ambientes de trabalho. As condições das fábricas eram precárias. Eram ambientes com péssima iluminação, abafados e sujos. Os salários recebidos pelos trabalhadores eram muito baixos e chegava-se a empregar o trabalho infantil e feminino. Os empregados chegavam a trabalhar até 18 horas por dia e estavam sujeitos a castigos físicos dos patrões. Não havia direitos trabalhistas como, por exemplo, férias, décimo terceiro salário, auxílio doença, descanso semanal remunerado ou qualquer outro benefício. Quando desempregados, ficavam sem nenhum tipo de auxílio e passavam por situações de precariedade.
 
Reação dos trabalhadores
Em muitas regiões da Europa, os trabalhadores se organizaram para lutar por melhores condições de trabalho. Os empregados das fábricas formaram as trade unions (espécie de sindicatos) com o objetivo de melhorar as condições de trabalho dos empregados. Houve também movimentos mais violentos como, por exemplo, o ludismo. Também conhecidos como "quebradores de máquinas", os ludistas invadiam fábricas e destruíam seus equipamentos numa forma de protesto e revolta com relação a vida dos empregados. O cartismo foi mais brando na forma de atuação, pois optou pela via política, conquistando diversos direitos políticos para os trabalhadores.
 
Conclusão
A Revolução tornou os métodos de produção mais eficientes. Os produtos passaram a ser produzidos mais rapidamente, barateando o preço e estimulando o consumo. Por outro lado, aumentou também o número de desempregados. As máquinas foram substituindo, aos poucos, a mão-de-obra humana. A poluição ambiental, o aumento da poluição sonora, o êxodo rural e o crescimento desordenado das cidades também foram conseqüências nocivas para a sociedade. 

Até os dias de hoje, o desemprego é um dos grandes problemas nos países em desenvolvimento. Gerar empregos tem se tornado um dos maiores desafios de governos no mundo todo. Os empregos repetitivos e pouco qualificados foram substituídos por máquinas e robôs. As empresas procuram profissionais bem qualificados para ocuparem empregos que exigem cada vez mais criatividade e múltiplas capacidades. Mesmo nos países desenvolvidos tem faltado empregos para a população.

sábado, 14 de janeiro de 2017

Como morreram os grandes ditadores da história

Como os 13 piores ditadores do mundo morreram



Publicado em 29.12.2011

Alguns ditadores têm mortes sangrentas, mas muitos morrem de velhice ou doenças naturais. Confira aqui 13 famosos ditadores modernos e as causas de suas mortes:
  1. Joseph Stalin, Rússia (1878-1953): derrame;
  2. Benito Mussolini, Itália (1883-1945): executado por comunistas, teve seu corpo pendurado de cabeça para baixo para exibição pública e confirmação de sua morte;
  3. Adolf Hitler, Alemanha (1889-1945): suicídio;
  4. Francisco Franco, Espanha (1892-1975): declínio de saúde e mal de Parkinson;
  5. Mao Zedong, China (1893-1976): declínio de saúde e possível esclerose lateral amiotrófica (doença de Lou Gehrig);
  6. Francois “Papa Doc” Duvalier, Haiti (1907-1971): diabetes e doenças cardíacas;
  7. Kim Il-Sung, Coreia do Norte (1912-1994): ataque cardíaco;
  8. Augusto Pinochet, Chile (1915-2006): insuficiência cardíaca e edema pulmonar;
  9. Nicolae Ceausescu, Romênia (1918-1989): executado por um pelotão de fuzilamento;
  10. Idi Amin, Uganda (1925-2003): falência múltipla de órgãos;
  11. Saddam Hussein, Iraque (1937-2006): considerado culpado de crimes contra a humanidade, foi enforcado;
  12. Moammar Gaddhafi, Líbia (1942-2011): capturado, espancado e morto por rebeldes;
  13. Kim Jong-Il, Coreia do Norte (1941 ou 1942-2011): ataque cardíaco. [LiveScience]

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

O negro de lá é o negro de cá



O negro no Brasil e nos Estados Unidos


George Reid Andrews
Professor da Universidade de Pittsburgh e pesquisador visitante do CEDEC


O Brasil orgulha-se de ser uma "democracia racial", enquanto os Estados Unidos são conhecidos pela aspereza de suas relações raciais. Ainda assim, desde a Segunda Guerra Mundial, os afroamericanos, que representam apenas 12% da população dos Estados Unidos, têm provado ter uma força política substancialmente maior na vida de seu país do que os afro-brasileiros, que representam talvez 50% da população brasileira. Por que acontece isso? Existiriam formas pelas quais a história da luta dos negros nos Estados Unidos poderia trazer luz às lutas anti-racistas no Brasil?
Como aconteceu lá
Talvez as mais impressionantes conquistas do movimento afroamericano, do período pós-45, aconteceram durante a sua primeira fase: o movimento pelos direitos civis dos anos 50 e 60. Considerando a história das relações raciais nos Estados Unidos até aquela data, os avanços conseguidos durante aqueles anos foram verdadeirarnente extraordinários. A segregação foi superada, o sufrágio definitivo foi estendido ao povo negro através do Ato dos Direitos de Voto de 1965, e o governo federal instituiu programas de "igualdade de oportunidades" e "ação afirmativa" para combater o racismo.
Essas conquistas transformaram o Estado nacional, de um impositor da desigualdade racial, em exatamente o oposto: um ativo e poderoso oponente da discriminação racial e fiador das oportunidades para o povo negro (e outras minorias raciais, como os índios americanos, porto-riquenhos e mexicanos) em áreas como educação, moradia e emprego.
Os avanços políticos dos negros continuaram nos anos 70, mas principalmente nos níveis locais e estaduais. Afro-americanos foram eleitos para câmaras municipais e legislativos estaduais em crescente número, e muitas cidades e comarcas americanas (incluindo Los Angeles, Chicago, Detroit, Washington, Filadélfia, para nomear algumas) são governadas por prefeitos negros. Mas, a nível nacional, os anos 70 foram um período de incerteza e estagnação para o movimento negro. Isto se deveu, em parte, ao assassinato de seu carismático líder Martin Luther King em 68, mas também, paradoxalmente, aos seus, sucessos durante os anos 50 e 60.
Em primeiro lugar, tendo superado as mais violentas e óbvias formas de discriminação racial, o movimento pelos direitos civis pareceu ter cumprido seu objetivo. Os tipos de discriminação que continuaram (e continuam) a existir eram muito mais sutis e difíceis de detectar e, portanto, era ainda mais difícil a mobilização de pessoas em seu repúdio. Em segundo lugar, os programas de oportunidades iguais possibilitaram a uma nova geração de afro-americanos o acesso às universidades, tornando-os assim parte dos profissionais liberais de classe média. Para esta jovem e crescente elite negra (talvez 15 a 20% da população negra), o sonho americano estava sendo realizado. Qual a necessidade, então, do movimento dos direitos civis? Sua missão tinha sido cumprida.
Mas, naturalmente, o racismo, que levou séculos para ser formado, não seria fácil e rapidamente extinto. Enquanto a nova classe média negra se beneficiava das oportunidades abertas pelo governo federal, o mesmo não acontecia com a sobrepujada maioria dos afro-americanos. Sua participação na renda nacional mostrou-se virtualmente imutável entre 1960 e 1980, permanecendo em níveis mínimos.
Os anos 70 também testemunharam uma retomada crescente do ressentimento e do ódio dos brancos contra os programas governamentais que presumivelmente favoreciam os negros. Esse movimento encontrou sua expressão política a nível nacional na eleição de Ronald
Reagan em 1968, que chegou à presidência prometendo eliminar os programas de igualdade de oportunidade e reduzir a ajuda governamental aos pobres, que, em grande número, são negros.

Uma resposta ao racismo renovado
Durante os anos da administração Reagan, a necessidade de revitalizar e rejuvenescer o movimento negro para defender as conquistas alcançadas durante os anos 60 e 70 tornou-se cada vez mais visível. Jesse Jackson, um ex-colaborador de Martin Luther King, emergiu como o líder desse movimento que reconhece a necessidade de estender-se para além da população negra a criação de uma aliança interracial que envolva vários grupos étnicos não-brancos, mulheres e brancos liberais: essa é a razão para o conceito de "coalizão arco-íris" de Jackson.
Ele não teve um sucesso completo na formação dessa coalizão. Suas posições anti-semitas foram particularmente destrutivas ao alienar o apoio de um grupo étnico tradicionalmente simpático às aspirações dos negros. Mas, a despeito dessas falhas, a campanha de Jackson para a candidatura democrata de 1984 provou ter uma grande força política, vencendo eleições em vários estados do Sul, alcançando até 25% dos votos em estados mais industrializados, como Illinois e Nova Iorque, e forçando o comprometimento do Partido Democrata em manter e estender as conquistas políticas dos negros dos anos 60. Respondendo ao ressurgimento do racismo americano representado por Reagan, o movimento negro norte-americano entra nos anos 80 com um sentido renovado de propósitos e missão.
No Brasil, um caminho mais longo
Como a experiência americana pode ser comparável àquela encontrada no Brasil? Nada refuta mais efetivamente o mito da "democracia racial" do Brasil que a extensa história da luta dos negros neste país. Nos últimos cem anos, nota-se uma progressão, desde o movimento abolicionista dos anos 1870 e 80, através das organizações culturais e políticas do período pós-1920 (a mais proeminente das quais foi a Frente Negra Brasileira, banida por Getúlio Vargas em 1937), até o Movimento Negro Unificado de hoje. Esses movimentos são uma evidência conclusiva — como se fosse necessária — da contínua existência da discriminação e desigualdade racial na multirracial sociedade brasileira.
Desde 1945 esses movimentos têm atraído entusiástico apoio de dezenas de milhares de seguidores e têm sido instrumento de estímulo à continuidade do debate público sobre as deficiências do "paraíso racial" brasileiro. Mas nenhum deles conseguiu gerar um movimento de massa, com o peso moral e político que fez de Martin Luther King, Andrew Young, Julian Bond, Jesse Jackson e outros líderes negros figuras de proeminência nacional nos Estados Unidos. Por que acontece isso?
Uma importante parte da resposta repousa no caráter paternalista e autoritário das relações sociais e políticas brasileiras, que, mesmo durante períodos de democracia, torna muito difícil construir um movimento político de massas autônomo e nacional.
Mas é importante notar que o movimento pelos direitos civis nos EUA surgiu, e teve as suas vitórias mais retumbantes, na região mais tradicionalista, autoritária e repressiva do país: os estados do Sul. O autoritarismo, em si só, não pode explicar as diferentes trajetórias das lutas negras nos dois países; deve-se prestar atenção também na natureza das relações raciais brasileiras, onde não existe a separação racial imposta pelo Estado, como se verifica na segregação norte-americana ou no apartheid sul-africano. O caráter substancialmente mais relaxado da hierarquia racial brasileira trabalha para minar a mobilização política afro-brasileira de múltiplas formas.

A necessidade de instituições próprias
Primeiramente, ao permitir a integração dos afro-brasileiros, ainda que em termos de inferioridade, nas instituições básicas da sociedade, no Brasil, reduz a necessidade do povo negro de desenvolver instituições sociais e culturais próprias e, por isso mesmo, mais autônomas, como a segregação racial exigiu nos Estados Unidos. Assim, o Brasil não compartilha com os Estados Unidos a tradição de igrejas e faculdades independentes, que favoreceram sensivelmente a formação da base ideológica e institucional e de liderança, para o movimento dos direitos civis.
Da mesma maneira, a ausência de um limite claramente estabelecido entre "negro" e "branco" no Brasil torna possível a cooptação, por parte do grupo racial branco, de afro-brasileiros particularmente talentosos e ambiciosos. Em um sistema mais rígido, tais indivíduos permanecem na casta racial negra e assumem posições de liderança dentro dela. Mas, no Brasil, não é impossível para eles negar a sua negritude; de fato, manter identidade afro-brasileira pode tornar-se um exercício consciente de força que muitos estão relutantes em assumir.

Valorizar a base moral do movimento
Uma forma ainda mais efetiva pela qual o sistema brasileiro de hierarquia racial trabalha contra a formação de um movimento político afro-brasileiro é depreciando a base moral desse movimento. Um dos mais importantes traços da luta afro-americana tem sido a habilidade de se apropriar dos valores morais para tirar vantagens políticas disso, explorando todas as mais óbvias injustiças da segregação e da discriminação racial, para mobilizar tanto os brancos oponentes ao racismo quanto os negros. Os segregacionistas ficaram finalmente impossibilitados de legitimar um sistema que visivelmente contradizia aqueles princípios tão definidos que a sociedade clamava por base: justiça, igualdade e liberdade.
Se a brutalidade e a crueza do racismo norte-americano provaram ser sua maior fraqueza, então, ao inverso, a flexibilidade e a sutileza do racismo brasileiro provaram ser a sua maior força. A indignação moral contra a desigualdade racial é muito mais difícil de ser gerada em um país onde a discriminação assenta-se sobre formas silenciosas e, às vezes, inconsistentes, tornando difícil identificá-la e transformá-la em ação política. Impede ainda mais a criação de um sentido de indignação contra o racismo a triste necessidade de combater toda uma série de injustiças que caracterizam a sociedade brasileira.
Milhões de negros brasileiros sofrem diariamente a injúria e as aflições da discriminação racial. Mas milhões de brasileiros, de todas as raças, sofrem talvez as mais básicas injúrias da miséria, desnutrição, ausência de oportunidade de educação, poluição ambiental. Claro que o racismo funciona como agravante dessas injúrias e, na mesma medida em que a sociedade é dividida racialmente, ela é vulnerável à dominação e exploração das camadas superiores. Até os membros do grupo racial dominante sofrem em si mesmos a situação, como tão eloqüentemente evidenciam as multidões de "brancos pobres" da América do Sul e do Brasil. Mas, dados os múltiplos desafios agudos e imediatos que confrontam a sociedade brasileira, o problema do racismo perde a relevância que tem nas sociedades mais prósperas e eqüitativas, como os Estados Unidos.
Ao se considerar estes obstáculos para a criação de um movimento anti-racismo, as conquistas políticas dos líderes e cidadãos afro-brasileiros durante o período da "abertura" ganham uma significação especial. Desde 1980 todos os partidos legais têm reconhecido publicamente a existência de discriminação racial e desigualdade racial no Brasil. Três dos partidos de oposição (PMDB, PDT e PT) constituíram comissões especiais ou grupos de trabalho para preparar políticas nessa área.
Em São Paulo, o governo Montoro criou um Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra, dando assim acesso direto aos líderes negros a altos níveis do governo do estado mais populoso e economicamente mais importante do Brasil. Os governos do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul estão agora estudando a criação de organismos parecidos. Num país que historicamente tem preferido ignorar qualquer indicação de desarmonia racial em suas fronteiras, estas iniciativas são importantíssimos passos à frente.
Recentemente, os líderes negros têm também gerado um substancial capital político, por chamarem a atenção pública para um dos mais brutais aspectos das relações raciais brasileiras — a repressão policial de afro-brasileiros e o preconceito, por parte dos órgãos penais (e de muitos cidadãos), de que "negro é bandido até que se prove o contrário". Denunciar essas práticas pode ajudar a gerar aquele senso de indignação moral que tem provado ser tão importante no movimento afroamericano.
Mas, lutando para criar um movimento nacional de massas, os líderes afro-brasileiros estão claramente face a um longo e íngreme caminho que envolve educação e luta. Não é por acidente que o movimento negro tem sido mais ativo e tem alcançado seus maiores êxitos no Estado de São Paulo, onde existe um sistema mais agressivo de relações entre brancos e negros, mais próximo daquele que existe nos Estados Unidos. Quando tenta se estender às áreas mais tradicionais do Brasil, a mobilização negra encontra obstáculos políticos, sociais e raciais discutidos acima.
Se o movimento negro no Sul segregacionista dos Estados Unidos era como o virtuoso Davi confrontando-se com um monstruoso, mas vulnerável, Golias, o movimento afro-brasileiro está frente a frente com um inimigo mutante, escorregadio e sobretudo invisível, que precisa ser antes revelado para poder ser derrotado. Assim sendo, conquistar uma "segunda abolição", no Brasil, a cada passo, será tão difícil como tem sido nos Estados Unidos. Talvez mais ainda.
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